72 ANOS DA PROCLAÇÃO DA REPÚBLICA POPULAR DA CHINA: DA
REVOLUÇÃO SOCIAL PARA ATUAL TRANSIÇÃO ORDENADA PELAS MÃOS DA BUROCRACIA
RESTAURACIONISTA PARA A ECONOMIA DE MERCADO
A bandeira nacional foi hasteada neste 1º de Outubro na Praça Tiananmen, na capital Pequim, no âmbito das comemorações do 72º aniversário da fundação da República Popular da China. Mais de 10.000 pessoas se reuniram no local emblemático da capital para cantar o hino nacional chinês. Em 1º de outubro de 1949,Mao Tse Tung proclamou a fundação da RPC, declarando: “O povo chinês se levantou.” A China é um ex-Estado Operário burocratizado que transita ordenadamente ao capitalismo e vem se convertendo em uma poderosa semicolônia, porque as bases econômicas do desenvolvimento chinês se apoiam em relações de produção capitalistas onde a burocracia restauracionista cada vez mais assume o papel de sócia subordinada e dependente do capital financeiro internacional. Na medida em que na China está em curso um processo de acumulação primitiva de capital para forjar a nova burguesia, a Casa Branca e o imperialismo europeu buscam incentivar no curso dessa transição divisões políticas que lhes favoreçam.
Historicamente, o imperialismo tem recorrido a vários meios políticos e militares para impor seu controle nos países que consideram adversários ou desejam fragilizar. As manifestações pela “autonomia total” de Hong Kong, pela independência no Tibet para “recriar” uma classe dominante baseada na dinastia lamaísta e as tentativas de patrocinar, desde o governo Clinton, o separatismo islâmico e muçulmano em algumas províncias chinesas via patrocínio da CIA às atividades da Al Qaeda na região são parte dessa estratégia que até agora tem fracassado pela unidade da burocracia em sua “via chinesa ao capitalismo”.
A grande mídia e a própria burocracia restauracionista qualifica a China como uma grande potência, no que é grotescamente imitada pela esquerda revisionista do trotsquismo. A realidade, no entanto, é distinta e deve ser analisada além das aparências. A China, no curso do processo de restauração capitalista, vem se transformando na verdade no maior entreposto comercial e industrial do mundo, uma grande consumidora de commodities e é nisto que consiste a sua “exuberância” econômica. Caracteriza-se por ser uma economia semicolonial com fortes induções estatais, remanescentes da herança stalinista. Em suma, por maior que seja o crescimento do PIB chinês, a hegemonia militar em todo o planeta ainda se concentra plenamente nas mãos da Casa Branca, sendo apenas um “sonho” da China converter-se em uma superpotência capitalista. Nesse sentido “a via chinesa” de restauração capitalista como vemos reafirmada por Xi Jinping é um processo lento, ordenado e centralizado de medidas que, levadas a frente sob o férreo controle político do PPCh, avançam o ritmo da restauração capitalista para se fortalecer futuramente como contraponto militar e econômico ao imperialismo ianque. Essa estratégia encontra-se resumida nas palavras do Secretário-Geral do Partido Comunista, Xi Jinping na abertura do XX Congresso do PCCh, ocorrido em Outubro de 2020.
Em um longo discurso ele descreveu seu governo
como uma nova era em que “a China se moverá para mais perto do centro do
palco”. Prometeu abrir ainda mais a economia e respeitar os interesses das
empresas estrangeiras no país. Um dos objetivos declarados de Xi Jinping é
levar a China a tornar-se uma “sociedade modestamente próspera” até 2021, nas
comemorações do centenário do PCCh. Para isso, será preciso manter o
crescimento na faixa de 6,5% ao ano até 2020. Outro objetivo é que, no
centenário da revolução, em 2049, ela seja um país rico e desenvolvido. O
Congresso do PC chinês ocorre a cada cinco anos quando a burocracia
restauracionista herdeira do stalinismo de Mao-Tsé-Tung anuncia formalmente ao
mundo seus planos estratégicos, políticos e econômicos. No discurso de Xi, Mao
foi apresentado como o responsável pela revolução socialista e pela
consolidação do Partido Comunista no poder. Deng Xiao Ping pela abertura e pela
era de crescimento econômico. Ele, Xi, pela conquista do poderio como
superpotência global. A realidade nem de longe é a retratada pelo dirigente da
burocracia tendo como base uma análise mais apurada do ponto de vista do
Marxismo Revolucionário.
O imperialismo ianque teve um peso determinante no processo
de restauração capitalista do antigo Estado Operário chinês como sócio
industrial. A China vem completando um processo de transição econômica onde
houve tanto uma renovação da legislação trabalhista (acarretando mais gastos
sociais para o Estado, em contraponto ao que ocorre hoje no Brasil) como a da
incorporação de grandes empresas estrangeiras ao patrimônio estatal, estes dois
elementos forçaram uma redução em investimentos públicos para o triênio
2014/2016. A previsão do governo de Pequim (que se confirmou) foi que em 2017 a
China retornasse seus níveis acelerados de crescimento (nos dois primeiros
trimestres do ano, o crescimento foi de 6,9%. Meta do governo chinês é crescer
cerca de 6,5% em 2017). Todos os países exportadores para a "locomotiva
chinesa" estão sendo afetados com a situação atual de crise econômica com
lenta recuperação nos EUA. O período mitigado de transição histórica que
atravessa a China, entre o capitalismo de estado dependente e um nascente
imperialismo mundial ainda não confirmado, faz com que a burocracia estatal
dirigente atue com a máxima cautela diante da crise mundial, isto significa
expor minimamente sua economia nacional a especulação financeira e acionária.
Um sistema financeiro estatal é uma boa garantia para afastar os
"apostadores" de plantão do cassino, digo do mercado. Esta
característica herdada e mantida do antigo Estado Operário não significa a
inexistência das bolsas ou mesmo de certo crédito privado para financiar o
desenvolvimento da indústria, afinal para quem pode se dar ao "luxo"
de ter uma colônia financeira, Hong Kong, não se faz necessário comprometer a
parte de sua economia "controlada". Na lama do capitalismo mundial o
governo chinês deliberou nos últimos anos por conceder alguns benefícios
sociais que haviam sido suprimidos no processo de transição que sepultou o
antigo Estado Operário Burocratizado. Ao contrário dos pigmeus do imperialismo
que difundem que o proletariado chinês é escravizado, a própria e insuspeita
ONU reconhece os avanços realizados nos últimos quatro anos.
TROTSKY, MAO E A REVOLUÇÃO CHINESA
Após a derrota da revolução chinesa de 1927 devido a capitulação de Stalin ao Kuomintang, e em meio a um processo de luta e resistência nacionalista na China, Mao Tse Tung escreve em 1941 seu famoso estudo chamado "Política e Cultura da Nova Democracia", documento que se tornou posteriormente o programa maoista revolucionário. Neste texto, Mao caracteriza a fisionomia sociológica, economica e cultural da sociedade chinesa da época como sendo colonial, semi-colonial e semi-feudal, porém não percebe que estas caracteristicas socio-economicas foram mantidas pela burguesia autóctone dependente, e eram por outro lado, base da dominação do capital imperialista sobre a nação através da divisão mundial do trabalho seguindo as leis do desenvolvimento desigual e combinado, onde se mesclaram neste processo dialético formas arcaicas de relações de produção com o que havia de mais avançado nas forças produtivas, fato histórico comum às nações de capitalismo atrasado, o que faz com que a revolução social nestes países coloque na ordem do dia, o confronto com a burguesia nacional e imperialista detentora das formas de propriedade e relações arcaicas, dando um caráter socialista a estas revoluções. No entanto, para Mao a revolução de Nova Democracia seria "(...) primeiro, a revolução democrática, e depois a revolução socialista — dois processos revolucionários de caráter inteiramente diferente. A democracia aqui mencionada não é a velha democracia, a democracia do velho tipo, mas a Nova Democracia, a democracia de novo tipo. Pode-se concluir, portanto, que a nova política, a nova economia e a nova cultura da nação chinesa nada mais são do que a política, a economia e a cultura da Nova Democracia. (...) A característica histórica da revolução chinesa é que ela se divide em duas etapas: a revolução democrática e a revolução socialista. A democracia da primeira etapa não é uma democracia no sentido geral, mas um tipo novo, especial, de estilo chinês, a Nova Democracia". (Mao Tse Tung, "A Nova Democracia").
Seguindo o raciocínio de Mao, o que seria neste caso então esta "democracia de novo tipo" ou de "estilo chinês"? Por acaso seria um "terceiro campo" democrático? Ou seria uma espécie de "democracia camponesa" pequeno burguesa, que nunca e em nenhuma época histórica existiu? Vemos aqui um claro rompimento com o critério de classe por parte de Mao, se esquecendo do fato de que o capitalismo ao se solidificar como sistema mundial, trouxe em seu bojo as únicas duas classes sociais que podem--pelo seu papel nas relações de produção--efetivamente tomar em suas mãos o controle da sociedade e consequentemente estabelecer sua democracia, que são justamente a burguesia e o proletariado; dessa forma, se a revolução de Nova Democracia não toca na propriedade privada capitalista, poís é na excência uma revolução burguesa, ela só pode neste caso ser uma democracia burguesa incompleta caracteristica dos países semicolôniais, poís a base material do Estado parido de tal revolução continua sendo burguês.
Trotsky já em 1905 em seu importante livro "Balanço e Perspectiva", polemizando com os marxistas da época, já mostrava a impossibilidade das revoluções burguesas no período de internacionalização das forças produtivas capitalistas nos países atrasados e apontava para o proletariado o caminho da revolução socialista: "(...) correspondentemente às suas tarefas mais próximas, a revolução começa como burguesa, mas rapidamente provoca poderosos conflitos de classe e só chega à vitória se transferir o poder à única classe capaz de se colocar à frente das massas oprimidas: o proletariado. Uma vez no poder, o proletariado não quer e nem pode se limitar ao marco de um programa democrático-burguês. (...) mas deve empregar a tática da revolução permanente, isto é, anular os limites entre o programa mínimo e o programa máximo da social democracia, passar para reformas sociais cada vez mais profundas e buscar um apoio imediato para a revolução na Europa ocidental." (Leon Trotsky, "Balanço e Perspectiva). Da mesma forma, Marx em pleno século XIX também percebia que estávamos adentrando a época das revoluções proletárias quando nos ensina em seu texto do "18 Brumário" que: "A revolução social do século XIX não pode tirar sua poesia do passado, e sim do futuro. Não pode iniciar sua tarefa enquanto não se despojar de toda veneração superticiosa do passado. As revoluções anteriores tiveram que lançar mão de recordações da história antiga para se iludirem quanto ao próprio conteúdo. A fim de alcançar seu próprio conteúdo, a revolução do século XIX devem deixar que os mortos enterrem seus mortos. Antes a frase ia além do conteúdo; agora é o conteúdo que vai além da frase." (Marx, 18 Brumário). Por outro lado, ao os comunistas chineses tomarem o poder em 1949, tiveram que logo em seguida passar a expropriar a propriedade burguesa sob pena de sofrerem com a contra revolução como bem analisou Trotsky em sua carta a Preobrazhensky de 1928 sobre o caráter da revolução chinesa depois de sua derrota neste ano: "O programa [do Partido Comunista da China] incluia não apenas o confisco de qualquer propriedade feudal que ainda existisse na China, não só o controle operário da produção, mas também a nacionalização da grande indústria, dos bancos e dos transportes, tanto quanto o confisco das residências da burguesia e de todas as suas propriedades em beneficio dos trabalhadores. Surge a pergunta: se esses são os métodos de uma revolução burguesa, então que aspecto teria a revolução socialista na China?". Assim também ocorreu em Cuba e nas demais revoluções que do século XX onde se estabeleceram Estados operários, para o avanço da revolução teve que necessáriamente expropriar a propriedade capitalista. Já o exemplo russo de fevereiro de 1917 --defendido pelo menchevismo-- nos mostra que sem expropriar inapelavelmente a propriedade burguesa, qualquer que seja ela, não pode haver avanço em direção ao socialismo como nos mostra também o exemplo dos maoistas no Nepal--acontecimento que é parte inevitável da dinâmica revolucionária se não suprimir a propriedade burguesa, onde muda-se o regime mas permanece a dominação de classe--, ficando claro a necessidade de Outubro e do caráter socialista das revoluções atuais ao contrário da crença revisionista maoísta.
CHINA: APESAR DA RESTAURAÇÃO EM CURSO, UM OBSTÁCULO PARA O IMPERIALISMO IANQUE AVANÇAR SEU DOMÍNIO ABSOLUTO SOBRE A ÁSIA
A China vem se convertendo lentamente em um grande obstáculo militar e econômico para os EUA. Possui o maior exército do mundo (quase 3 milhões de soldados), um poderio bélico poderoso que inclui a bomba de nêutrons e mísseis de longo alcance com capacidade de carregar ogivas nucleares. Diferente do que ocorreu no processo de restauração capitalista na ex-URSS, onde a casta burocrática se dividiu em várias frações que disputavam o que restou do antigo Estado operário (processo hoje parcialmente revertido por Putin), o objetivo da burocracia chinesa é estabelecer uma lenta e ordenada transição da economia planificada para o capitalismo, sendo ela mesma convertida em proprietária dos meios de produção. Precisamente por isto a burocracia chinesa pretende realizar uma transição a mais ordenada possível, não podendo destruir de imediato o Estado operário. O atual ritmo da restauração do capitalismo na China não interessa aos EUA, por isso procuram de todas as formas debilitar a China. Foi assim em 1996, quando os EUA deslocaram porta-aviões, submarinos nucleares e navios de guerra para as proximidades da costa chinesa, a fim de "proteger" o enclave imperialista de Taiwan; em 1999 a OTAN bombardeou "por engano" a embaixada chinesa em Belgrado; em 1º de abril de 2001, um avião de espionagem norte-americano chocou-se com um caça chinês sobre o Mar da China Meridional.
Os marxistas revolucionários estão na primeira linha de defesa da nação chinesa contra as agressões imperialistas, apesar de afirmamos claramente o caráter venal e corrompido dos ex-burocratas “comunistas” que liquidaram as principais bases sociais do Estado operário, para se converterem em uma nova classe social dominante. Apesar da restauração capitalista, o que proporcionou a China a criação de um dos maiores mercados do mundo, parte das conquistas do proletariado ainda estão de pé e sob ameaça da ofensiva imperialista. É exatamente neste ponto que se concentram todo o ódio da burguesia ianque contra a China, não podem admitir que um país recém-convertido à economia “livre” de mercado, mantenha conquistas operárias que devem ser eliminadas pelo “ajuste financeiro” global que promovem contra os povos. Portanto, mantém-se plenamente vigente o prognóstico do Programa de Transição, apontando que os bolcheviques-leninistas devem combinar a luta pela revolução socialista nos ex-Estados operários com as tarefas pendentes da luta política em defesa das conquistas ainda existentes. As constantes provocações contra o Estado nacional chinês cumprem, em última instancia, o objetivo de acabar com qualquer possibilidade de que algum regime ao redor do planeta se oponha ainda que minimamente ao “american way life”, como são os casos específicos da Coreia do Norte e Irã. Somente a revolução proletária, encabeçada por um autêntico partido revolucionário poderá retomar o controle para si da economia planificada na China e o controle do Estado por parte dos trabalhadores e enfrentar frontalmente a barbárie imperialista rumo à construção do socialismo.
POR UMA NOVA REVOLUÇÃO SOCIALISTA NA CHINA!
A burocracia chinesa por sua natureza política contrarrevolucionária, é incapaz de enfrentar os ditames do capital, e por sua consciente política de restauração capitalista, se torna cúmplice do imperialismo. Somente a ação do gigantesco proletariado chinês, dirigido por um partido revolucionário, pode pôr a termo o processo de restauração capitalista, através da revolução política, e derrotar a política ameaçadora de polícia mundial do imperialismo ianque contra o Estado operário chinês. Para o proletariado chinês está colocada na ordem do dia a luta por uma nova revolução proletária no antigo Estado operário, hoje em conversão ao capitalismo, já que tanto as alavancas fundamentais de sua economia socialista foram todas suprimidas pela camarilha restauracionista, assim como parte da burocracia stalinista inicia o processo de acumulação primitiva para transformar-se em classe burguesa, orientando abertamente todos os setores do Estado em favor de uma apropriação privada de capital como estamos vendo com as resoluções tiradas nesse XIX Congresso do PCCh. Só uma revolução socialista na China encabeçada por um genuíno partido revolucionário, pode retomar a economia e o controle do Estado para as mãos dos trabalhadores, unindo de forma revolucionária a China em torno da construção do socialismo, como foram dados os primeiros passos neste caminho com a revolução de 1949.